
Em uma entrevista com os irmãos Duplantier, em 2021, a jornalista Eleanor Goodman, da revista britânica Metal Hammer, sentenciou: “Gojira vai além do que uma banda de metal deveria soar no momento. Eles são a banda que o mundo precisa nos dias de hoje“.
É uma declaração potente, sem meias palavras, que fala de uma banda seminal no cenário atual do heavy metal. A atenção que a mídia dá aos franceses do Gojira se deve a alguns fatores: o ativismo do grupo na conservação do planeta, as letras filosóficas sobre nosso papel no mundo, a explosão e emoção no palco e a mescla de gêneros, que vão do metal mais técnico, groove e o progressivo.
O foco dos caras é na música e menos na parafernália típica de bandas do gênero, como os rostos pintados, os monstros que caminham pelo palco, as máscaras, a solenidade de rituais macabros. Nada disso. O Gojira se mostra e não teme de falar sobre seus sentimentos como eles são e, por isso, acredito que criaram uma comunidade tão engajada de fãs mundo afora.
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Em 2013, um ano após o lançamento de L’Enfant Sauvage, vi o Gojira no Monsters of Rock, numa tarde ensolarada na Arena Anhembi que tinha um line up dominado por bandas do velho nu metal, como Korn e Limp Bizkit. Ninguém deu muita bola pros caras! Nem a organização do evento, que os colocou pra tocar com o sol rachando do meio-dia, gente ainda chegando, outros comendo hambúrguer e procurando uma sombra. Eu gostei do que vi, mas não imaginava a projeção que eles ganhariam.

Em 14 de novembro de 2023, dez anos depois, eles voltaram com a turnê ao lado do Mastodon, outra banda que costumo falar por aqui como um dos expoentes do novo metal. E digo, com alguma sobra em relação a outras apresentações, que foi o melhor show de metal que vi em 2023. Sobretudo o do Gojira. Eles subiram ao palco do Espaço Unimed, em São Paulo, para fechar a noite.
Foi um show maior e mais maduro do que vi em 2013. Com público maior, estrutura de luzes e palco mais incrementada e um setlist, naturalmente, mais longo e variado, composto sobretudo de canções dos álbuns mais conceituados, From Mars to Syrius (2005) e Magma (2016), passando pelas novas músicas do disco mais recente, Fortitude (2021), incluindo, claro, Amazonia, composta em protesto aos incêndios e à destruição da Amazônia que traz na sonoridade uma pegada bem Roots do Sepultura, com berimbau e tudo o mais.
Os irmãos Joe (vocal) e Mario (bateria) Duplantier comandam as ações no palco. Em alguns momentos, o baterista toma a frente, chama o público, conduz os coros. E, no final um tanto inusitado, ele se lança num bote inflável que é carregado pelo público, com o alerta do irmão Joe, que o vê se distanciar do palco: “Por favor, tragam ele de volta em segurança”.
Joe é um cara comum no palco. Não faz muitas estripulias, cara de mal ou grandes performances. Mas ele canta a sua verdade com empolgação, fazendo com que o público acredite em cada palavra gritada por ele. Tem uma emoção e um mistério que os conectam com os fãs, justamente por serem tão diferentes do padrão-sexo-drogas-rock’n’roll.

No início, quando o grupo surgiu em 1996, Joe lembra que eles ouviam e admiravam bandas de death metal como Morbid Angel, Cannibal Corpse e Death. As primeiras demos falavam sobre morte, fantasmas, sangue, assim como a maioria das bandas da época. Não tinha nada muito inovador ali. Mas já no primeiro álbum, Terra Incognita, o Gojira deixou de lado a temática e os padrões musicais do metal mais tradicional para imprimir seu próprio universo, tratando de temas existenciais, meio ambiente e espirituais.
Algumas músicas no show, como Flying Whales e The Chant, soam como orações para o universo em busca de respostas sobre o papel do ser humano na jornada da vida. Em The Chant, Joe convoca a plateia para entoar um mantra que percorre toda a apresentação, do começo ao fim. Vi jovens de 20 e poucos anos cantando cada letra com a energia de quem sabe o que está falando e entende o que a banda prega.
Isso não quer dizer que o Gojira deixa de lado o peso do metal em prol da mensagem. Eles combinam muito bem a técnica (são ótimos músicos), a atmosfera e a força de sua música a um ativismo pertinente à época em que vivemos. Falam com propriedade de um assunto urgente, sem medo de quebrar normas e preconceitos de quem vive o metal.

Putz queria ter ido nesse show, mano! Tenho escurado muito Gojira! Valeu pelo depoimento
Fala, mano, que prazer ter sua visita por aqui. Obrigado demais!! Quando quiser falar sobre algum rolê de metal aí nos EUA o espaço tá aberto 😉